No vale-tudo das Olimpíadas

Rodrigo Marins

11 de abril de 2011

Francisca de Pinho Melo, de 44 anos, vivia numa simples, mas espaçosa residência erguida sobre a marcenaria do marido. Moradora do Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, descobriu em julho de 2010 que a sua casa estava no caminho da Transoeste, um corredor de ônibus de alto desempenho, projetado para ligar o Aeroporto do Galeão à Barra da Tijuca, uma das principais obras de mobilidade prometida para a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. “Tentamos negociar, mas não teve jeito. Em dezembro, demoliram tudo. Recebi 11 mil reais de indenização, o que não dá sequer para erguer um barraco. Perdemos o lar e o sustento”, lamenta, momentos antes de cair num choro renitente. “Agora, toda a minha família está desempregada. Não sei como pagar a faculdade da minha filha e ainda temos de gastar 250 reais no aluguel de um casebre apertado, caindo aos pedaços.”

No anúncio das demolições, prazo de "zero dia" para o povo deixar suas casas

Outro morador afetado é o babalorixá Sérgio Luiz Campos, de 58 anos, que nem ao menos recebeu o comunicado de despejo. Surpreendeu-se quando o trator apareceu para demolir sua casa, em 16 de março. “Minhas coisas continuam na rua, ao lado de uma árvore, protegidas apenas por uma lona de plástico. Passei a viver no meu templo de candomblé com outra família desalojada. Mas a prefeitura também quer derrubar o terreiro”, conta Campos, que vive há 30 anos no Recreio dos Bandeirantes. “Eu me recuso a aceitar uma indenização irrisória e abdicar dos meus direitos.”

Este bairro é apenas uma das mais de cem comunidades ameaçadas de remoção no Rio, boa parte delas em razão das obras para os megaeventos esportivos que a cidade vai receber. Além da Transoeste, com um custo estimado de 800 milhões de reais para os seus 56 quilômetros de extensão, estão previstas a Transolímpica, que ligará o Recreio dos Bandeirantes a Deodoro, e a Transcarioca, projetada para interligar a Barra e a Penha. Os projetos são inspirados nos corredores de ônibus expressos de Curitiba (BRTs). Mas, na pressa de concluir as obras a tempo da Copa e da Olimpíada, a prefeitura tem feito remoções a toque de caixa, sem negociar alternativas com as famílias afetadas, acusa a Defensoria Pública do Rio de Janeiro. Um problema que o prefeito Eduardo Paes (PMDB) já previa em maio de 2010, ao anunciar os projetos. “Teremos 3 mil desapropriações na Transcarioca. Para a Transolímpica, buscaremos reduzir isso com a construção de túneis”, antecipou à época.

Fonte: Carta Capital


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