Também somos sociedade, diz morador de favela incendiada

03 de abril de 2014

Líder comunitário de área com 1,6 mil pessoas, devastada por incêndio na Penha, zona leste de São Paulo, disse que se a prefeitura não der solução, famílias voltarão a ocupar terreno

por Janaina Garcia

“Nós moramos na favela, mas somos sociedade – e não somos só quando vêm pedir nosso voto, ok?” O desabafo é do carpinteiro Ronaldo José da Silva, 42 anos, líder de um grupo de 400 famílias, ou cerca de 1,6 mil pessoas, de uma comunidade devastada pelo fogo no bairro da Penha, zona leste de São Paulo. O incêndio começou nessa quarta-feira pouco depois das 15h e começou a ser contido três horas depois.

As chamas consumiram praticamente todos os 400 barracos – cerca de 10% não foram atingidos. Segundo o Corpo de Bombeiros, uma das causas prováveis é um curto-circuito nas ligações elétricas irregulares (‘gatos’) do local.

De acordo com o líder comunitário, os moradores esperam “uma reposta concreta da prefeitura” para que possam deixar a área, localizada às margens de um córrego e debaixo do viaduto Engenheiro Alberto Badra (Aricanduva).

“Estou aqui há cinco anos e nove meses e já passei por três incêndios em que perdi o pouco que tinha. O prefeito anterior (Gilberto Kassab) não resolveu, e sobrou para o atual (Fernando Haddad) descascar esse pepino.” Para Silva, “não é questão de (oferecer) albergue, mas de garantir moradia”. “Vamos ficar aqui, dormir na calçada, se for preciso, e voltar a ocupar o nosso lugar. O que estão fazendo com a gente não é legal.”

Nesta quinta, o líder comunitário irá com um grupo de moradores à Defensoria Pública do Estado pedir que sejam tomadas providências no campo jurídico para garantir o direito à habitação das famílias atingidas pelo incêndio. Sobre as prováveis causas do incêndio, Silva reforçou a hipótese dos bombeiros. “Algumas ligações irregulares estava ‘torando’, pegando fogo”, admitiu.

“Estou no olho da miséria”, diz moradora
Auxiliar de limpeza no Sumaré, bairro nobre da zona oeste de São Paulo, Maria Aurides Menezes, 29 anos, disse – ainda com o crachá da empresa em que trabalha no peito – que soube pela TV do incêndio na comunidade onde mora. “Estou no olho da miséria de novo”, resumiu, ela que já havia perdido roupas, eletrodomésticos e o antigo barraco em outro incêndio no local, em 2012.

“Tenho três filhos e recebo um salário mínimo. Se eu pago aluguel, no preço em que ele está, como faço para alimentar minhas crianças?”, questionou, para completar: “Se o governo não gastasse tanto com estádios para a Copa, quem sabe não sobraria recurso para construir moradia para quem precisa”, comparou.

“Eu tinha fogão, uma TV velha e geladeira. Queimou tudo. Até os lençóis que eu tinha recebido de doação pelo último incêndio foram embora, fiquei só com a roupa do corpo”, complementou a sogra de Maria Aurides, a também auxiliar de limpeza Adenilda de Jesus Santos, 55 anos, que vivia no barraco com a filha, o neto e o genro.

PM usa bombas e balas de borracha
Por volta de 18h30, um grupo de moradores mais exaltados, aos gritos de “Moradia! Moradia!”, lançou pedras contra policiais militares e ameaçaram queimar placas de madeira. Os PMs lançaram granada de efeito moral e dispararam balas de borracha para revidar, e contiveram o tumulto.

Indagado sobre a necessidade desse tipo de revide, o major Márcio Santiago Higachi, comandante da operação no local, respondeu: “Reagimos a uma situação de risco. A senhora foi atingida por pedras? Não, né?”, perguntou, dirigindo-se a uma repórter.

Equipes da Defesa Civil foram ao local para cadastrar as famílias, mas, até o início da noite, não havia ainda a definição sobre um local para onde seriam levadas.

 

Fonte: Terra Notícias

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