Manifesto da Vila Nova Esperança

Leia abaixo o texto integral do manifesto lançado esta semana por moradores da comunidade Vila Nova Esperança, situada no extremo oeste da cidade de São Paulo. Nele está consignada a luta que vem sendo travada pela sua permanência da região, que tem sido ameaçada por ações da CDHU.

” MANIFESTO DA VILA NOVA ESPERANÇA: PELA PERMANÊNCIA DA COMUNIDADE E CONTRA AS AÇÕES DA COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO

Há algumas décadas, o histórico de violência em áreas ocupadas por moradores na região Metropolitana de São Paulo, frente à inexistência de uma política habitacional efetiva, ganha inúmeros episódios. Isso envolve diversos fatos que, em nome do que o Poder Público considera como necessário e traduzido sempre como progresso, ignora-se a amplitude do direito à habitação.

Neste contexto, reconhecemos a ampla dificuldade de uma parcela significativa da população com poucos recursos que se estabeleceu em São Paulo durante as décadas 60, 70 e 80. Diante da impossibilidade de acesso às áreas mais centrais da cidade, dotadas de infra-estruturas, um número expressivo de famílias necessitaram adquirir lotes em áreas mais afastadas, pois seus preços estavam, naqueles momentos, no patamar possível de ser pago aos indivíduos menos favorecidos da sociedade. Tratam-se, em alguns casos, de bairros e comunidades em que a reivindicação de serviços básicos ao Poder Público permanece até a presente data. Os problemas se ampliam a partir do momento em que as próprias comunidades constituídas diante da ausência de uma política de acesso à terra urbana e moradia são desconsideradas nas ações públicas, como insiste a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo, na tentativa de retirada de nossas casas na Comunidade Vila Nova Esperança, localizada nas proximidades da Rodovia Raposo Tavares, no extremo oeste do município de São Paulo e na divisa com Osasco e Taboão da Serra. Somos aproximadamente 500 famílias com um histórico de luta para a conquista da moradia. Muitos de nós trabalhamos incessantemente para construir e a ampliar nossas casas há, no mínimo, 15 anos, e agora compomos mais um episódio da busca por afirmação de que São Paulo se constitua em um espaço democrático e de garantias à população de baixa renda.

Em 2006 nossa Comunidade foi notificada pela CDHU a respeito da urbanização da área, do atendimento da nossa maior reivindicação. A instituição iniciou um processo de coleta de dados para formação do cadastro necessário para dar início à urbanização do bairro. No entanto, o momento da assinatura da ficha a respeito dos procedimentos futuros referia-se, na realidade, à tentativa de fazer com que nós ratificássemos os termos para a retirada de nossas casas. A partir daí, desdobra-se uma situação de luta para continuidade da Comunidade.

A CDHU afirma que o terreno será utilizado para a implantação do “Parque Urbano de Conservação e Lazer Fazenda Tizo”. No entanto, o projeto inicial do Parque não abrangia a área onde está localizada a comunidade Vila Nova Esperança. Na verdade, ele previa a nossa permanência, sendo que, inclusive, fomos importantes colaboradores para o abaixo-assinado que levou à sua criação (Decreto 50597, de 27 de março de 2006). Em reunião realizada em 2010 com os porta-vozes da CDHU, enfatiza-se em alto tom a legalidade e a transparência pela qual a instituição agia, cabendo a todos nós acatar a decisão legal de forma tranquila. Para tanto, ela, a CDHU, oferecia duas possibilidades, ou melhor, a adesão de um de seus dois “produtos” a alguns moradores: carta de crédito ou o financiamento em um apartamento dos conjuntos habitacionais em Cotia.

A grande maioria da Comunidade não aceitou as determinações da CDHU, pois não houve nenhum canal para expor nossos reais anseios. Sendo assim, as ações da instituição no local tem sido constantes – seus mandatários estão presentes na comunidade desde dezembro de 2010 promovendo uma pressão que aponta para os questionáveis termos democráticos e transparentes no caso. A fala “saia já porque senão os tratores passarão por cima de vocês e de suas famílias” se tornou uma fala recorrente destes indivíduos que atuam em nome da CDHU. Além disso, no dia 17 de março de 2011 pela manhã, dia da audiência do interdito proibitório solicitado pela Associação Independente Vila Nova Esperança, vários indivíduos apareceram na Comunidade para alegar o cancelamento da mesma. Frente às manifestações dos moradores, alguns desses mandatários da CDHU mostraram-se armados e fizeram ameaças verbais e também apontaram as armas para o grupo de residentes no local. Nossa Comunidade procurou a delegacia mais próxima (DP 75ª) para realizar um Boletim de Ocorrência e teve seu pedido negado pela delegada. Isto porque o promotor Luiz Eduardo Ismael Lutti, atrelado aos interesses que cercam a retirada da Vila Nova Esperança, já havia entrado em contato e “intermediado” a situação.

Diante da obscuridade da situação, queremos exigir que a violência não faça parte de nosso cotidiano. Aliás, o que garante que esta ação não está em acordo com especulação imobiliária da região? Devemos lembrar que a busca contínua de lucros, não se fez, numa cidade como São Paulo, e tampouco se faz, sem a violência, explícita e implícita. E é por esse motivo que nós, moradores da Vila Nova Esperança, assinamos este manifesto contra a violência e as ações que passaram a fazer parte do cotidiano da Comunidade. Queremos o direito de usufruir de nosso bairro, o que inclui debater a urgente e necessária preservação do meio ambiente. Neste ponto, estaremos sempre abertos ao diálogo.

Em meio a esse impasse, continuamos sem os serviços de energia e de esgoto e andando diariamente 1,5km da Vila até o ponto de ônibus mais próximo para chegar ao trabalho. A urbanização da Comunidade deve ser uma prioridade do poder público e colocada como uma das formas para proteger o meio ambiente.

Mesmo com a ajuda de movimentos sociais dos bairros Butantã e Raposo Tavares, com pedido de auxílio a vereadores, deputados, Defensoria Pública, Subprefeitura do Butantã e aos próprios Geraldo Alckmin e Gilberto Kassab, até agora nada foi feito pela Vila Nova Esperança. Por enquanto, o Poder Público e a CDHU apenas tiram a tranqüilidade e pretendem destituir-nos do que foi conquistado durante anos de árduo trabalho.

Por fim, deixamos publicamente uma das principais razões de ser da existência da Associação Independente Vila Nova Esperança: que a constante e crucial luta pela conservação ambiental se faça conjugando as reais necessidades da população de baixa renda nas múltiplas dimensões, o que se fará tão somente coma atuação democrática e participativa da população envolvida. Sendo assim, assinamos este manifesto ratificando a necessária:

• Permanência dos moradores no local, respeitando suas trajetórias de luta para constituição de suas casas;
• Diálogo pacífico na direção de constituir uma relação e um manejo sustentável entre a Vila Nova Esperança e o Parque Tizo;
• Urbanização da Vila Nova Esperança.

A Vila Nova Esperança estará unida para levar a cabo as reivindicações presentes nesse manifesto!
Moradores da Vila Nova Esperança”

Fonte: Associação Independente Vila Nova Esperança ( associacaovne@gmail.com)

 

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