(Português) Conselhos de Serviço Social e de Psicologia divulgam relatório sobre abrigos do Rio de Janeiro

Leia relatório dos Conselhos Regionais de Serviço Social (7ª região) e
de Psicologia (5ª região) sobre a situação da Rede de assistência à população
de rua do Rio de Janeiro. A pesquisa realizada pelas duas entidades foi
feita entre julho e novembro de 2010. Confira abaixo:

Os Conselhos Regionais de Psicologia 5ª Região e de Serviço Social
7ª Região, em consonância com a Política de Direitos Humanos defendida
pelas atuais gestões destas autarquias e naquilo que é determinado pelas
prerrogativas legais enquanto órgãos fiscalizadores das profissões de Psicólogo
e Assistente Social, realizou no período de julho a novembro de 2010, fiscalizações
na Rede de Assistência à População de Rua, a saber: Abrigo Rio Acolhedor
Paciência; Abrigo Maria Thereza Vieira (Praça Seca); Centro de Acolhimento
Adailza Spozatti (Realengo); Centro Municipal de Acolhimento Plínio Marcos
(São Cristóvão), Central de Recepção de Adultos e Famílias Tom Jobim e
Unidade Municipal de Acolhimento Stella Maris (ambos na Ilha do Governador).

Considerando as condições gerais físicas e estruturais, de trabalho das
equipes técnicas e da relação construída com a população atendida, estes
Conselhos vêm, através deste Relatório, denunciar o total descumprimento
do Decreto nº 7.503/ 2009 que institui a Política Nacional para População
em Situação de Rua, conforme descrição detalhada abaixo.

1) Abrigo Rio Acolhedor Paciência: a população atendida é composta por
adultos de ambos os sexos. Destaca-se a super lotação e inadequação da
estrutura física, tendo em vista que o local era um espaço escolar, no
qual foi improvisado um Abrigo sem nenhum preparo para esta finalidade.
Como exemplo, podemos citar a Ala masculina onde todos os homens dormem
em colchonetes dispostos no chão de um grande galpão. Muitos deles possuem
doenças infecto-contagiosas, não havendo equipe de saúde no local para
a assistência aos mesmos e, também, foi verificada a dificuldade encontrada
pela equipe de articulação com a rede de saúde da região. Além destas,
verificamos a falta de preparo da equipe técnica pela indefinição sobre
a natureza do equipamento de acolhimento por parte da Gestão. Observamos,
também, número de banheiros insuficientes e em péssimas condições e falta
de ventilação nos quartos. Causa-nos preocupação o fato da instituição
estar localizada próxima a um ponto de comércio de drogas ilícitas e o
perfil dos residentes, onde segundo a equipe técnica, há um grande índice
de dependentes químicos (cerca de 70% da população), destaque especial
para dependência de crack.

2) Abrigo Maria Thereza Vieira (Praça Seca): a população atendida é composta
por grupos familiares. Destaca-se a total falta de higiene do local, que
conta somente com um profissional para limpeza de todo o estabelecimento.
Os banheiros estavam alagados, imundos e em numero insuficiente para uso.
Havia lixo por toda parte, inclusive nos telhados, fezes humanas nos corredores
e pátio, onde havia crianças circulando. Os quartos, que são distribuídos
por família, também estavam muito sujos e em alguns casos as pessoas dormiam
em colchonetes no chão. Apesar de o espaço ser amplo e arborizado, existem
locais com o piso quebrado e uma área interditada pela Defesa Civil devido
ao risco de desabamento da encosta, tornando o espaço perigoso para os
residentes. Preocupa-nos o fato pelo mesmo ser uma instituição de acolhimento
de família, contando com muitas crianças e gestantes. Segundo a Diretora
da instituição, o Abrigo atende a 197 pessoas, das quais 110 são crianças
e adolescentes, sem possuir para isso equipe técnica, educadores sociais
e administrativos suficientes. No momento da fiscalização, ficou evidente
a falta de profissionais no local, dando a impressão de total abandono.
A Diretora relatou que todos os adultos possuem algum tipo de transtorno
psiquiátrico e necessitam de atendimento especializado. Ressaltamos que
não há equipe de saúde no local para a assistência aos mesmos, o que dificulta
a continuidade do tratamento dos residentes junto à Rede de Saúde.

3) Complexo Stella Maris: o que estamos denominando Complexo é a conjugação
de três equipamentos distintos no mesmo local, a saber: Central de Recepção
de Adultos e Famílias Tom Jobim, Unidade Municipal de Acolhimento Stella
Maris e o CREAS Stella Maris. Destacamos que os portões do Complexo permanecem
trancados com corrente e cadeado. Ademais, considerando as distintas naturezas
dos referidos equipamentos, há dificuldade de compreensão das finalidades
de cada equipamento, inclusive pelos funcionários, prejudicando o plano
de trabalho das equipes técnicas.

3.1)Central de Recepção de Adultos e Famílias Tom Jobim (Ilha do Governador):
toda estrutura é precária, insuficiente e sem higiene. Na Ala feminina
há um amontoado de colchões no chão em quantidade insuficiente para as
residentes. Não há porta, mas um tapume? separando o espaço do pátio central,
inviabilizando qualquer privacidade por parte das mulheres. Na Ala masculina,
a situação é mais grave. Ocorre uma super lotação, com colchonetes espalhados
pelo chão do salão central e, também, nos corredores do entorno. Todo ambiente
é insalubre, estando os colchões em péssimo estado e em quantidade insuficiente.
Apesar de relatos contrários, observamos a presença de mulheres alojadas
na Ala masculina. No geral, os banheiros são insuficientes e com condições
de higiene precárias. Destacamos a periculosidade do local, onde encontramos
uma enorme quantidade de vidros quebrados espalhados pelos corredores das
Alas e Pátio Central. Num canto, inclusive, encontramos grande quantidade
de garrafas de cachaça. Tais fatos preocupam-nos devido ao clima de grande
tensão observado durante a fiscalização entre os residentes e na relação
destes com a equipe técnica. Segundo alguns funcionários já houve casos
de linchamento entre os residentes e violência contra a equipe técnica.
Apesar de ser uma Central de Recepção, segundo a Assessora do equipamento,
a população atendida permanece por mais tempo do que o preconizado (acima
de seis meses). Tal fato descaracteriza a natureza do equipamento e interfere
na qualidade dos serviços prestados.

3.2) Unidade Municipal de Acolhimento Stella Maris: a população atendida
é composta por adultos de ambos os sexos. Verificamos grande quantidade
de residentes com transtornos psiquiátricos. A Ala masculina não apresenta
condições de higiene adequadas. A Ala feminina apresenta melhores condições
de higiene devido ao trabalho realizado pelas próprias residentes na limpeza.
No geral, os banheiros são insuficientes e com condições de higiene precárias.

Destaca-se o projeto Casa-Lar? para atendimento a 28 mulheres portadoras
de transtornos psiquiátricos, sem a presença de uma equipe de saúde mental
para o devido atendimento.

4) Centro de Acolhimento Adailza Spozatti (Realengo): a população atendida
é composta por adultos do sexo masculino. ? o Abrigo onde as condições
de higiene encontram-se mais adequadas em comparação aos demais equipamentos
fiscalizados. Não foi identificada nenhuma situação estrutural grave que
mereça ser destacada.

5) Centro Municipal de Acolhimento Plinio Marcos (São Cristóvão): a população
atendida é composta por adultos do sexo masculino. Destacamos que o Abrigo
localiza-se embaixo do viaduto de São Cristóvão. Verificamos muitas rachaduras
e infiltrações que provavelmente são decorrentes da constante trepidação
provocada pela passagem dos veículos no viaduto. No geral, as condições
de higiene são precárias, em especial nos banheiros. Observaram-se, também,
alguns casos de pacientes psiquiátricos e dependentes químicos.

A partir do relato acima, percebemos que algumas questões são comuns a
todos os equipamentos e que, possivelmente, estão relacionadas à forma
de gestão do poder público, que evidencia um tratamento de total inadequação
em relação ao Decreto Federal nº 7.503/ 2009. Tudo indica que a atual estrutura
de serviços disponibilizada pelo município do Rio de Janeiro opera mais
em função de continuidade de uma política truculenta de choque de ordem?
e de retirada destes indivíduos das ruas, do que na promoção de ações efetivas
de asseguramento dos direitos inerentes a uma verdadeira condição de cidadania.
Neste sentido destacamos:

1) Insuficiência de profissionais para o atendimento adequado aos residentes
abrigados;

2) Falta de condições mínimas de trabalho para equipe técnica desenvolver
um trabalho adequado junto à população atendida, tanto no que tange às
condições estruturais quanto a capacitação profissional.

3) Total dependência da rede pública de serviços e dificuldade de articulação
com a mesma. Destacamos a rede de saúde, pela quantidade de residentes
com transtornos mentais, dependência química, tuberculose, entre outras
doenças infecto-contagiosas.

4) Condições estruturais insalubres que propiciam a proliferação de doenças
infecto-contagiosas já existentes.

5) Falta de trabalho efetivo visando a desinstitucionalização do abrigado.
Há casos de pessoas que nasceram e que percorreram toda a sua vida residindo
em Abrigos. Foi observada, em praticamente todos os estabelecimentos, uma
total ociosidade dos Abrigados.

6) Todos os Abrigos estão em regime de co-gestão (Prefeitura e Organizações
Sociais), gerando problemas operacionais no cotidiano, inviabilizando,
muitas vezes, a compra de materiais básicos de consumo e, em última instância,
adequações necessárias das condições de trabalho da equipe técnica.

Colocamo-nos à disposição para quaisquer informações que se fizerem necessárias.

Respeitosamente,

Fátima da Silva Grave Ortiz

Presidente

CRESS 7ª Região

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