(Português) A bola da vez: Vila Autódromo

Dar como certo algo duvidoso é uma estratégia conhecida para resolver
uma questão sem mesmo problematizá-la. ? o que o jornal O Globo tenta fazer
em sua reportagem de capa desta terça, 04/10, sobre a possibilidade de
remoção da Vila Autódromo, comunidade situada em área próxima ao futuro
Parque Olímpico, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Após indicar sem qualquer
motivo que seus 
moradores estavam praticando assaltos na fila de entrada do Rock in Rio,
o jornal agora destaca 
na manchete: Após o rock, Rio removerá favela para as Olimpíadas?,
e na página 12: Vila Autódromo na reta final?. 

A certeza do jornalista Luiz Ernesto Magalhães estaria baseada na minuta
do edital da parceria público-privada (PPP). Lançado pela prefeitura para
consulta pública, a cláusula quinta trata da localização do Parque Olímpico
e determina a desocupação da totalidade da área atualmente ocupada pela
comunidade denominada Vila Autódromo?. No entanto, a própria reportagem
admite que essa questão é muito cara aos movimentos sociais, que vêem o
local como um símbolo da resistência contra as remoções em toda a cidade.

 

Imagem da reportagem do Globo: dando como certo o que não é certo.

O edital da PPP prevê que 75% dos 1,2 milhão de metros quadrados sejam
entregues a iniciativa privada após os Jogos Olímpicos, para a construção
de condomínios residenciais, comerciais e hotéis. Um repasse de terreno
público com a justificativa de que o consórcio de empreiteiras arcaria
com parte dos custos de construção do Parque Olímpico, estimados em R$
1,3 bilhão. Cabe lembrar que só a Transcarioca (uma das três vias expressas
que estão sendo construídas) supera esse valor, pra ficar apenas em uma
das obras para os grandes eventos.

O fato é que a Prefeitura do Rio não precisa da iniciativa privada para
viabilizar a obra. Optando por deixar como legado à cidade um bairro de
elite, o que já é uma opção questionável, seria mais lógico investir recursos
próprios na região e vender os lotes valorizados às construtoras após 2016.
No entanto, o prefeito Eduardo Paes opta por garantir o acesso aos terrenos
por contrato e a baixo custo já em 2011, o que lhe garante o apoio financeiro
das empreiteiras à sua campanha à reeleição ano que vem. Para o Rio restará
um novo bairro de elite, viabilizado com terrenos públicos, à beira da
Lagoa de Jacarepaguá.

Escavadeiras da Odebrecht trabalhando na construção da Transoeste. (foto:
Renato Cosentino)

Não é de hoje que a prefeitura quer deixar a região livre para a expansão
imobiliária. A Vila Autódromo, uma antiga colônia de pescadores que com
o tempo se transformou em moradia para muitos dos trabalhadores que construíram
a Barra da Tijuca, sofreu em primeiro lugar com o impacto do crescimento
da cidade para a Zona Oeste e a consequente poluição do ambiente natural
de que tirava o seu sustento. Chega a ser previsível que um governo que
preza pela homogenização dos espaços da cidade, sem considerar a população
local, queira agora a remoção. Para Paes, é inadmissível valorizar uma
área ocupada por moradores de baixa renda, mesmo que eles possuam o título
de posse, como é o caso.

Altair Antunes Guimarães, de 55 anos, é o presidente da associação de
moradores da Vila Autódromo. Ele vivia na Ilha dos Caiçaras, na Lagoa Rodrigo
de Freitas, quando este mesmo processo de remoção de comunidades aconteceu
na Zona Sul, nas décadas de 60 e 70. Expulso de casa, acabou sendo levado
com a sua família para a Cidade de Deus, aos 14 anos. De lá foi removido
mais uma vez para a passagem da Linha Amarela no mandato de Luiz Paulo
Conde (1997-2000), quando então se mudou para a Vila Autódromo. Agora,
enfrenta a terceira remoção em quatro décadas: O sentimento é que você
está sempre incomodando, tendo que dar espaço?.

Pescadores da Vila Autódromo e os condomínios da Barra da Tijuca ao fundo.
Expansão imobiliária agora atinge o outro lado da Lagoa. (foto:
Candy Pilar Godoy)

A Prefeitura do Rio e o Globo sabem que a remoção da Vila Autódromo não
será fácil como a manchete de capa e a imagem da reportagem, as partes
mais vistas do jornal, querem dar a entender. A resistência do Canal do
Anil em 2007, comunidade próxima à Vila do Pan-Americano e que também esteve
na mira das máquinas da prefeitura, ainda está fresca na memória de todos.
Se a Vila Autódromo hoje é considerada uma favela é porque a própria prefeitura
nunca assumiu a sua urbanização. Esta luta está apenas começando, não é
a primeira e nem será a última. Altair terá muito apoio para, após duas
derrotas, enfim comemorar a sua primeira vitória. O futuro dirá.

Fonte:
Cidades Possíveis

3 responses to “(Português) A bola da vez: Vila Autódromo”

  1. Vila autódromo says:
    É uma verdadeira batalho tipo: Davi x golias e a “poderosa” globo com certeza está do lado do golias, mas todos sabem o término dessa história bíblica e o resultado dessa nova batalha que está sendo travada não será diferente, dará Davi de novo porque mais que Deus ninguém.

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